Mundo Asperger, por Victor Mendonça

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Eu já disse várias vezes que final de ano é época complicada para o asperger. Afinal, gastamos o dobro de esforço para decodificar as muitas tarefas e a agitação coletiva ao término de cada período letivo. Quando chegam as férias, vem a sensação de que enfim podemos relaxar. Essa tranquilidade é aparente. A falta de rotina bagunça o cérebro aspie. Ela pode gerar crises, surtos de ansiedade e estresse tão grandes quanto os que ocorrem quando estamos em aula.

Quando não conseguimos encontrar equilíbrio e nos organizar, um outro desafio se revela muito mais difícil: as comemorações de final de ano. São momentos em que a socialização se faz presente de forma extrema. A busca então passa a ser por um consenso em que esse contato com amigos e familiares seja benéfico. Que os limites da pessoa com autismo sejam respeitados e ouvidos, mas não como forma a incapacitar o autista ao convívio social. Afinal, podemos nos divertir e aprender bastante quando estamos em contato com o outro.

Para atingir a meta principal (frequentar as festas de final de ano de forma agradável), antes temos que prestar atenção em objetivos menores os quais, se bem administrados, podem funcionar como a escada que nos leva até a aspiração maior. Quando nos conhecemos bem, fica mais fácil amenizar ou mesmo eliminar alguns dos mais duros obstáculos. Logo no primeiro dia de férias, em que fiquei em casa sem muito o que fazer, me percebi mais agressivo e irritado. Liguei para um amigo e, conversando, pude identificar os horários em que isso acontece (geralmente mais ao fim do dia, às 18h). Ele me sugeriu que adotasse um cronograma de atividades, oscilando entre mais leves (que vejo como as em que posso dispersar) e as desafiadoras (as que me exigem maior concentração para cumpri-las).

Essa ideia vem dando certo, mas é preciso aplicá-la através de um planejamento que embora não seja totalmente inflexível, traga consigo um pouco das regras e disciplina de quando estava em aula. Também é preciso atentar à medicação e relatar esse processo ao médico, lembrando que a reação de cada pessoa à química é bastante particular.

Assim, vamos mais equilibrados às comemorações familiares de Natal e Ano Novo. Lá, é interessante estarmos em um grupo familiar que nos faça sentir bem, e dentro dessa esfera, procurar interagir mais com quem compartilhamos maior afeto e afinidade. O espaço do autista deve ser respeitado quando ele sentir a necessidade de ficar um pouco na dele. O excesso de informações, de diálogos e barulhos, incomoda. Mas se soubermos como dosar tudo isso pelo bem de todos, sem forçar demais a barra de ninguém, aí teremos momentos muito especiais para serem lembrados.

Boas festas para todos!

Victor Mendonça, 18 anos, asperger diagnosticado aos 11, é escritor, palestrante e estudante de jornalismo pelo UniBH. Escreve para o Tudo Bem Ser Diferente com a coluna Mundo Asperger. Mantém coluna semanal homônima na WebrádioUniBH, com veiculação às terças feiras. É apresentador, ao lado da jornalista Selma Sueli Silva, do Canal Mundo Asperger no Youtube, cujo link é https://www.youtube.com/channel/UCqF3BLbPXpNGNgsV3oJvDlw, com estreia marcada para 18 de dezembro próximo. No jornalismo impresso, atua como colunista e repórter da Revista “Estrada da Serra”, publicação da Manduruvá Editora. Autor do livro “Outro Olhar – Reflexões de um Autista”. mundoaspergervictormendonca@gmail.com https://www.facebook.com/omundoasperger?fref=ts